s rachaduras na parede da Igreja de São Francisco de Assis, na cidade mineira de Mariana, podem ser vistas como cicatrizes dos anos e anos de descaso com o patrimônio histórico brasileiro. Inaugurado em 1794, o templo está infestado de cupins e corre o risco de desabar – bem como várias outras igrejas de Ouro Preto. Rachaduras e insetos não são as únicas marcas da negligência. Em Erechim, no Rio Grande do Sul, um prédio de alvenaria de 1933 foi demolido sem autorização. No Recife, Pernambuco, 12 estátuas do Circuito da Poesia foram depredadas. Na Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres, em Jaboatão dos Guararapes, também em Pernambuco, os azulejos brancos portugueses da fachada estão caindo. Já em Juazeiro do Norte, no Ceará, a estátua de Padre Cícero perdeu a ponta dos dedos da mão direita. E tudo isso aconteceu apenas em julho.
Para tentar restaurar e conservar o que sobrou de patrimônio histórico no Brasil, o Ministério da Cultura vai lançar no dia 28 o Programa de Aceleração do Crescimento das Cidades Históricas. Abrigado sob o generoso guarda-chuva do PAC, o projeto deverá injetar R$ 150 milhões por ano em 124 cidades históricas, com obras de requalificação urbanística, infraestrutura urbana, financiamento para recuperação de imóveis privados, restauro de monumentos e promoções do patrimônio cultural.
Entre as cidades, estão as 27 capitais, municípios da Costa do Descobrimento, da Chapada Diamantina e da rota do ouro em Minas Gerais e em Goiás, 18 localidades na Bacia do Rio São Francisco, além das demais localidades tombadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
O plano envolve recursos da Casa Civil e dos ministérios das Cidades, do Turismo e da Educação. Até o ano que vem, o PAC das Cidades Históricas será voltado para 50 cidades, que ainda não foram todas escolhidas – segundo o Ministério da Cultura, mil imóveis privados devem receber financiamento nesta primeira fase, além de cem monumentos e prédios públicos serem restaurados e 120 atividades produtivas locais receberem investimentos. Algumas regiões já enviaram orçamentos para o projeto. Em São Luís (MA), por exemplo, o centro histórico pode ser revitalizado ao custo de R$ 50 milhões, enquanto Laguna (SC) deverá receber R$ 8,5 milhões para obras de cabeamento subterrâneo das redes de energia elétrica, e Corumbá (MS) vai pleitear R$ 10 milhões para reforma de imóveis históricos.
“É uma iniciativa inédita, tanto pela criação de uma política urbana com objetivos bem definidos, quanto pelo possível incremento da economia dessas cidades”, diz o ministro da Cultura, Juca Ferreira. Na segunda fase do PAC, entre 2011 e 2012, as 74 cidades restantes vão entrar no pacote – o Iphan afirma que também poderá aceitar propostas de outros municípios interessados no projeto. “As regiões históricas têm os mesmos problemas de grandes metrópoles, mas as restrições são bem maiores. Não basta só proteger, é preciso investir na conservação e no uso desses patrimônios”, diz o ministro.
Para o prefeito de Ouro Preto (MG) e presidente da Associação de Prefeitos das Cidades Históricas Brasileiras, Ângelo Oswaldo, tão importante quanto o dinheiro é a necessidade de uma política de preservação do patrimônio. “Começamos esse diálogo com o governo federal para mostrar a necessidade de uma política conjunta com as prefeituras”, diz. “É simples, se não há preocupação e investimento, a memória desaparece.”
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